Em junho de 2004, a OABPR realizou um encontro brasileiro para tratar das prerrogativas profissionais. O presidente Manoel Antonio de Oliveira Franco nos incumbiu da coordenação. Os maiores nomes da advocacia brasileira se fizeram presentes. O manifesto final, obra de muitas mãos, destacou: "... A persecução criminal e a execução das penas vêm exibindo, no Brasil, aspectos extremamente preocupantes, especialmente no que concerne aos direitos e garantias fundamentais do indivíduo. De um lado, a banalização da prisão provisória, que encarcera primeiro para investigar depois, tem constituído, com o beneplácito de parcela do Judiciário, aplauso da mídia e omissão de muitas instituições, regra geral. Além disso, tal vulgarização constitui importante fator de esmaecimento do caráter de excepcionalidade que deve marcar a prisão processual; o passo coercitivo subseqüente à prisão temporária é sempre a decretação da prisão preventiva, constrição esta que suprime a liberdade do imputado durante o curso do processo e que colide com o princípio universal da não-culpabilidade ou presunção de inocência. De outra parte, potencializa-se sensivelmente a investigação secreta, realizada, como método de ação, pela Polícia e, não raro, pelo Ministério Público, entregando-se os dois segmentos a perquirições que alcançam, seguidamente, parâmetros constitucionalmente inaceitáveis (chegam informações da existência de células oficiosas de escuta telefônica, devassamento e captação de dados, como estratégia de prospecção geral de delitos, tudo ao largo do controle jurisdicional). Tais procedimentos ofendem o ordenamento jurídico brasileiro, violentando o direito constitucional de intimidade e privacidade. Em suma, constituem hipóteses concretas de infrações penais.
No desenvolvimento de atividades investigatórias, alguns setores das referidas instituições munidos de autorizações judiciais, concedidas sem maior critério, cuidado e prudência, têm invadido escritórios de advogados, violando-lhes os arquivos e o sigilo profissional, e realizando interceptações epistolares, telefônicas, de dados e telemáticas, na busca de possíveis indícios ou provas de atos de terceiros, transformando o exercício da defesa técnica da liberdade humana em atividade de alto risco. Desnecessário pontuar que tais ações, anômalas, sempre cercadas de grande estrépito junto a opinião pública , levam ao desmerecimento os profissionais visados, aviltando-os perante a comunidade profissional e o meio social.
Por último, a maior parte dos meios de comunicação social vem fazendo desmedido alarde desses reprováveis métodos de investigação subterrânea e autoritária, apresentando-os como valor social que se sobrepõe, pelo utilitarismo, à própria garantia das liberdades pessoais, da privacidade, do contraditório e do devido processo legal. Trasmite-se ao público a sensação de que vale a pena se trocarem liberdades e garantias individuais por falsa promessa de segurança e de punição.Também por isso muitos juízes se inclinam ao proferir decisões que , autorizando tais diligências domiciliares, contornam direitos fundamentais, de índole constitucional . Há notícias de que a emissora de televisão aberta contaria com o privilégio da exclusividade na divulgação desses espetáculos policiais em primeira mão, como contrapartida da subliminar mensagem suasória, ao público, de que "punição, a qualquer preço, é preciso, respeito aos direitos constitucionais não é preciso...".
Um grande alerta pois registra a história que aqueles povos que trocaram liberdades individuais por "segurança coletiva" acabaram ficando sem os dois!
Elias Mattar Assad (eliasmattarassad@yahoo.com.br) é presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas
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